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"text": "Você acredita mesmo que o mundo é um lugar simples?",
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"text": "Sim, este mundo é espantosamente simples, assim como a própria vida.",
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"from": "User",
"text": "Este é um argumento idealista? Ou você está falando de uma teoria viável? Ou seja, está dizendo que todos os problemas que você, eu ou qualquer um enfrenta na vida são simples?",
"type": "question"
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"from": "Polaris",
"text": "Sim, isso mesmo.",
"type": "statement"
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"from": "User",
"text": "Tudo bem, mas me deixe explicar por que decidi fazer esta visita. Primeiro, quero debater esse assunto com você até me dar por satisfeito e, depois, se possível, quero fazer você refutar sua própria teoria.",
"type": "statement"
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"from": "Polaris",
"text": "Muito bem, meu jovem!",
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"from": "User",
"text": "Já ouvi muita coisa a seu respeito. As pessoas dizem que existe um filósofo excêntrico morando aqui e que os ensinamentos e argumentos dele são difíceis de ignorar. Segundo ele, as pessoas podem mudar, o mundo é simples e todos podem ser felizes . Foi isso que ouvi, mas acho esse ponto de vista um tanto descabido, por isso quis confirmar pessoalmente. Se eu considerar que você disse algo absurdo, vou apontar e corrigir… Mas você não vai ficar irritado, vai?",
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{
"from": "Polaris",
"text": "Não, eu ficarei feliz com essa oportunidade. Venho querendo ouvir as ideias de um jovem como você e aprender o máximo possível com o que puder me contar.",
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"from": "User",
"text": "Obrigado. Não pretendo rejeitar logo de cara tudo o que você tem a dizer. Vou levar seus pontos de vista em consideração e pensar a respeito. Você afirma que o mundo é simples, e a vida, também; mas essa tese só pode ter o mínimo de verdade se for dita por uma criança. As crianças não têm obrigações óbvias, como pagar impostos ou trabalhar. São protegidas pelos pais e pela sociedade e podem passar dias e dias sem qualquer preocupação. Podem imaginar um futuro eterno e fazer o que quiserem. Não precisam encarar uma realidade sombria, pois têm os olhos vendados. Então, para elas, o mundo deve mesmo ser simples. O problema é que, à medida que a criança amadurece e se torna adulta, o mundo revela sua verdadeira natureza. Em pouco tempo, ela vai descobrir como as coisas são de verdade. Sua opinião vai mudar e ela passará a ver apenas impossibilidades. Aquela visão romântica acaba sendo substituída pelo realismo cruel.",
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"text": "Entendi. Interessante.",
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"from": "User",
"text": "E isso não é tudo. Quando crescer, a criança vai se envolver em relacionamentos complicados e receber todo tipo de responsabilidades. É assim que a vida será para ela no trabalho, em casa ou em qualquer papel que assumir na sociedade. Nem preciso dizer que ela se conscientizará de vários problemas sociais que não compreendia na infância, como a discriminação, a guerra e a desigualdade. Quando se der conta dessas coisas, não será capaz de ignorá-las. Estou errado?",
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{
"from": "Polaris",
"text": "Soa correto para mim. Por favor, continue.",
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"from": "User",
"text": "Se ainda vivêssemos numa época em que a religião predominava, a salvação poderia ser uma opção, porque os ensinamentos divinos eram a verdade do homem e significavam tudo. Só precisávamos obedecer aos ensinamentos e, consequentemente, tínhamos pouco em que pensar. Mas a religião perdeu o poder e agora não existe mais uma crença real em Deus. Como não temos mais nada em que confiar, estamos cheios de ansiedade e dúvidas. Cada um vive por si. Assim é a sociedade de hoje. Por isso, considerando tudo o que eu disse e sabendo que somos controlados por essa realidade, por favor, me responda: como você pode continuar afirmando que o mundo é simples?",
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"text": "Não mudo nada do que eu disse. O mundo é simples e a vida também.",
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"text": "Como assim? Qualquer um vê que o mundo é um caos cheio de contradições.",
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"text": "Mas isso não acontece porque o mundo é complicado. Acontece porque você está transformando o mundo em algo complicado.",
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"text": "Estou?",
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"text": "Não vivemos em um mundo objetivo, mas em um mundo subjetivo ao qual damos sentido. O mundo que você vê é diferente daquele que eu vejo e impossível de compartilhar com qualquer pessoa.",
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"from": "User",
"text": "Como isso é possível? Você e eu estamos vivendo no mesmo país, na mesma época, e estamos vendo as mesmas coisas!",
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"from": "Polaris",
"text": "Sim, mas preste atenção: você já bebeu água que acabou de ser tirada do poço?",
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"from": "User",
"text": "Sim. Faz muito tempo, havia um poço na casa da minha avó, no interior. Eu lembro que gostava de beber aquela água fresquinha nos dias quentes de verão.",
"type": "statement"
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{
"from": "Polaris",
"text": "Você já deve saber que a água de poço permanece praticamente o ano inteiro na mesma temperatura, 18 graus. Mas quando você bebe a água no verão, ela parece fresca. Já quando bebe a água no inverno, parece morna. Embora seja a mesma água aos mesmos 18 graus que marca o termômetro, sua sensação varia de acordo com a estação do ano.",
"type": "statement"
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"from": "User",
"text": "Isso é uma ilusão causada pela mudança da temperatura ambiente.",
"type": "statement"
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{
"from": "Polaris",
"text": "Não, não é uma ilusão. Para você , naquele momento o frescor ou calor da água é um fato inegável. É isso que significa viver em um mundo subjetivo. A maneira como vemos as coisas é tudo. Neste momento, o mundo lhe parece um caos complicado e misterioso, mas, se você puder mudar seu modo de pensar, ele parecerá simples. Não se trata de como o mundo é, mas de como é.",
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"from": "User",
"text": "Como eu sou?",
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{
"from": "Polaris",
"text": "Imagino que, para você, é tão natural enxergar o mundo através de óculos de sol que tudo acaba parecendo escuro. Se é isso, em vez de lamentar a escuridão do mundo, você poderia tirar os óculos. Talvez o mundo pareça terrivelmente brilhante e você acabe fechando os olhos sem querer, ou talvez queira colocar os óculos de volta… Mas será que consegue tirá-los, para começo de conversa? Consegue olhar direto para o mundo, sem filtro? Você tem essa coragem?",
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"from": "User",
"text": "Coragem?",
"type": "question"
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"from": "Polaris",
"text": "Sim, é uma questão de coragem.",
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{
"from": "User",
"text": "Humm… Tudo bem. Posso fazer um monte de ressalvas a isso, mas tenho a impressão de que é melhor deixar para depois. Por ora, prefiro confirmar: você está sugerindo que as pessoas podem mudar, é isso? Se eu posso mudar, o mundo mudará e voltará a ser simples.",
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{
"from": "Polaris",
"text": "Claro que as pessoas podem mudar e, assim, encontrar a felicidade.",
"type": "statement"
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{
"from": "User",
"text": "Todas as pessoas, sem exceção?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Absolutamente nenhuma exceção. E todas podem encontrar a felicidade agora mesmo.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "A conversa está ficando interessante. Já tenho muitos questionamentos para fazer.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Não vou fugir nem esconder nada. Vamos discutir tudo com calma. Então você acredita que as pessoas não conseguem mudar?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Exatamente. Na verdade, eu mesmo sofro por não conseguir mudar.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "E, ao mesmo tempo, você gostaria de conseguir.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Claro. Se eu conseguisse mudar, se pudesse recomeçar minha vida, eu daria o braço a torcer e me ajoelharia aos seus pés com o maior prazer. Mas, no fim, talvez seja você quem acabe se ajoelhando diante de mim.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Tudo bem. Nossa conversa vai ser ótima. Você me faz lembrar de mim mesmo na época de estudante, quando eu era um jovem audacioso em busca da verdade, percorrendo a cidade atrás de filósofos.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Sim, estou à procura da verdade… A verdade sobre a vida.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Nunca senti necessidade de ter discípulos e nunca os tive. Porém, desde que me tornei um estudioso da filosofia grega e, mais tarde, entrei em contato com “outra filosofia”, sinto que, no fundo, venho esperando há muito tempo pela visita de um jovem como você.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Outra filosofia? Qual?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Agora há pouco você falou em “outra filosofia”, mas ouvi dizer que sua especialidade é a filosofia grega.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sim, a filosofia grega tem sido fundamental na minha vida desde a adolescência, sobretudo os grandes pensadores: Sócrates, Platão, Aristóteles. Atualmente estou traduzindo uma obra de Platão e espero passar o resto da vida estudando o pensamento grego clássico.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então qual é a “outra filosofia”?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "É uma escola de psicologia criada pelo psiquiatra austríaco Alfred Adler no início do século XX. Costuma ser chamada de psicologia adleriana ou psicologia individual.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Nunca imaginei que um especialista em filosofia grega se interessasse por psicologia.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Não conheço bem os caminhos percorridos por outras escolas, mas posso afirmar que a psicologia adleriana está completamente alinhada com a filosofia grega e que é um vasto campo de estudo.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Conheço um pouco da psicologia de Freud e Jung. É um campo fascinante.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sim, Freud e Jung são muito famosos. Adler foi um dos membros originais da Sociedade Psicanalítica de Viena, comandada por Freud. Suas ideias contrariavam as de Freud, por isso ele se separou do grupo e propôs uma “psicologia individual” baseada em suas teorias originais.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então Adler foi discípulo de Freud?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Não, não foi. Muita gente pensa isso, mas está errado. Precisamos desfazer essa ideia. Em primeiro lugar, Adler e Freud eram mais ou menos da mesma idade e estavam em pé de igualdade como pesquisadores. Quanto a isso, Adler foi bem diferente de Jung, que reverenciava Freud como uma figura paternal. Embora a psicologia costume ser associada apenas a Freud e Jung, Adler é reconhecido como um dos três gigantes nesse campo de estudos.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Entendi. Eu deveria ter estudado mais a respeito dele.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "É natural que não tenha ouvido falar em Adler. Como ele mesmo disse: “Pode chegar o tempo em que ninguém lembrará meu nome. As pessoas podem até esquecer que nossa escola chegou a existir.” Mas ele não se importava. Com isso, queria dizer que, se suas teorias fossem esquecidas, seria porque suas ideias haviam superado os limites da área de estudos e se tornado comuns, uma sensação compartilhada por todos. Por exemplo, Dale Carnegie, que escreveu os best-sellers Como fazer amigos e influenciar pessoas e Como parar de se preocupar e começar a viver , referiu-se a Adler como “um grande psicólogo que dedicou a vida a pesquisar o ser humano e suas habilidades latentes”. A influência de Adler está claramente presente em todos os textos de Carnegie. Grande parte do conteúdo de Os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes , de Stephen Covey, lembra muito as ideias de Adler. Em outras palavras, em vez de ser uma área de estudos delimitada, a psicologia adleriana é aceita como um ponto culminante das verdades e do entendimento humano. No entanto, dizem que as ideias de Adler estavam 100 anos à frente de seu tempo, e até hoje não conseguimos compreendê-las plenamente, de tão revolucionárias que eram.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então suas teorias não se desenvolveram apenas com base na filosofia grega, mas também na psicologia adleriana?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Isso mesmo.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Tudo bem. Mas você é filósofo ou psicólogo?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sou filósofo, vivo a filosofia. Para mim, a psicologia adleriana é uma forma de pensamento alinhada com a filosofia grega, e isso é filosofia.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Certo. Vamos começar.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Primeiro, vamos separar os pontos de discussão. Você diz que as pessoas podem mudar. Depois dá um passo à frente e diz que todos podem alcançar a felicidade.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sim, todos, sem exceção.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Vamos deixar a discussão sobre a felicidade para depois e falar primeiro sobre a mudança. Todos desejam poder mudar. Sei que eu desejo, e tenho certeza de que, se você perguntar isso a qualquer pessoa na rua, ela vai concordar. Mas por que todos sentem que querem mudar? Só há uma resposta: querem porque não conseguem. Se fosse fácil, não passariam tanto tempo desejando. É por isso que as pessoas são atraídas por religiões e cursos de autodesenvolvimento, mas não vemos ninguém dando conselhos práticos sobre como mudar. Estou errado?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Vou responder com uma pergunta: por que você está tão certo de que as pessoas não conseguem mudar?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Vou explicar. Tenho um amigo que não sai do quarto há muitos anos. Ele tem vontade de sair e até acha que gostaria de ter um emprego. Portanto, ele quer mudar sua forma de ser. Digo isso como amigo dele. Garanto que é uma pessoa bem séria que poderia ser bastante útil à sociedade. Só que ele tem medo de sair do quarto. Se dá um único passo para fora, começa a ter palpitações, e sente os braços e as pernas tremerem. Acho que é uma espécie de neurose ou pânico. Ele quer mudar, mas não consegue.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Por que acha que ele não consegue sair?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Não sei bem. Pode ser por causa do relacionamento com os pais ou porque sofreu bullying na escola. A partir daí pode ter desenvolvido um trauma. Mas também pode ser o inverso: talvez ele tenha sido mimado demais na infância e não consiga encarar a realidade. Eu não sei e não posso bisbilhotar o passado ou a situação familiar dele.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Então você está dizendo que acontecimentos do passado causaram um trauma, ou algo parecido, e como resultado ele não consegue mais sair de casa.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Claro. Antes de um efeito existe uma causa. Isso não é nenhum mistério.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Então talvez a causa de ele não conseguir mais sair na rua esteja no ambiente doméstico durante a infância. Ele sofreu violência dos pais e chegou à vida adulta sem nunca sentir amor. Por isso tem medo de interagir com as pessoas e não consegue sair na rua. É possível, não?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Sim, totalmente possível. Imagino que, para ele, seja um verdadeiro desafio.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "E aí você diz: “Antes de um efeito existe uma causa.” Ou, em outras palavras, quem eu sou agora (o efeito) é determinado por ocorrências no passado (as causas). Estou entendendo certo?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Está.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Mas se o aqui e agora é produto de acontecimentos do passado, como você diz, a situação não seria estranha? Veja bem: todos os que foram vítimas de violência dos pais quando pequenos deveriam sofrer os mesmos efeitos que seu amigo e se tornar reclusos, ou então sua ideia de que o passado determina o presente e de que as causas controlam os efeitos está furada.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Aonde exatamente você quer chegar?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Quando nos concentramos apenas nas causas do passado e tentamos explicar os fatos do presente com base na relação entre causa e efeito, o resultado é o que chamamos de “determinismo”. Se isso é verdade, nosso presente e nosso futuro são inalteráveis, já foram decididos por acontecimentos do passado. Estou errado?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Então você está dizendo que o passado não importa?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sim, esse é o ponto de vista da psicologia adleriana.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Entendo. Agora nossos pontos de conflito parecem um pouco mais claros. De acordo com a sua versão, meu amigo não teria motivo para não conseguir sair de casa, porque os incidentes do passado não importam. Sinto muito, mas isso não faz sentido. Tem que haver algum motivo para a reclusão. Tem que existir alguma explicação!",
"type": "exclamation"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Mas não existe nenhuma explicação. Na psicologia adleriana, não pensamos em “causas” do passado, mas em “metas” do presente.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Metas do presente?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Você diz que seu amigo está inseguro, por isso não consegue sair na rua. Mas inverta o pensamento: ele não quer sair, por isso está criando um estado de ansiedade.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Como assim?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Reflita: antes de tudo, seu amigo tinha a meta de não sair na rua, por isso está criando um estado de ansiedade e medo como meio de alcançar essa meta. Na psicologia adleriana, isso se chama “teleologia”.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Isso é uma piada? Está dizendo que meu amigo está imaginando tudo isso? Como você tem a audácia de dizer que ele simplesmente finge estar doente?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Ele não está fingindo. A ansiedade e o medo de seu amigo são reais. Às vezes, ele pode até sofrer de enxaqueca e cólicas estomacais violentas. Mas esses também são sintomas que ele criou para alcançar a meta de não sair de casa.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Isso não é verdade! De jeito nenhum! É um absurdo!",
"type": "exclamation"
},
{
"from": "User",
"text": "Se você vai fazer afirmações tão radicais, vou querer uma explicação minuciosa. Para começar, explique melhor a diferença entre etiologia e teleologia.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Vamos supor que você tenha pego um resfriado, esteja com febre alta e vá ao médico. Ele diz que você se resfriou porque ontem saiu sem se agasalhar. Você ficaria satisfeito com isso?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Claro que não. O motivo não me interessaria… Tanto faz a roupa que eu estava vestindo, se estava chovendo, etc. Eu iria querer saber dos sintomas, do fato de estar com febre e por aí vai. Preciso que o médico me trate prescrevendo remédios, dando injeções ou tomando quaisquer medidas necessárias.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Aqueles que assumem uma posição etiológica – inclusive muitos psicólogos e psiquiatras – argumentariam que você está sofrendo de algo que é resultado de tal e tal causa no passado, e acabariam consolando você, dizendo: “Não é culpa sua.” O argumento em torno dos chamados traumas é típico da etiologia.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Espere aí! Você está negando a existência do trauma?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sim, estou. Totalmente.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Como pode? Você, ou melhor, Adler não é uma autoridade em psicologia?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Nós transformamos a experiência em algo que atende aos nossos propósitos?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Exato. Preste atenção no argumento de Adler aqui. Ele diz que o eu não é determinado por nossas experiências, mas pelo sentido que damos a elas. Ele não está dizendo que a experiência de uma terrível calamidade ou violência durante a infância – ou outros incidentes do gênero – não tem influência na formação da personalidade. Na verdade, a influência é forte. Mas o importante é que nada é determinado de fato por essas influências. Somos nós que determinamos nossa vida de acordo com o sentido que damos às experiências passadas. Sua vida não é algo que alguém dá a você, mas algo que você próprio escolhe, e é você quem decide como viver.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então está dizendo que meu amigo se trancou no quarto porque optou por viver dessa forma? Isso é uma loucura! Acredite, não é isso que ele quer. No mínimo, é algo que ele foi forçado a escolher devido às circunstâncias. Ele não teve opção além de se tornar quem é agora.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Não. Mesmo que seu amigo realmente pense Não consigo me encaixar na sociedade porque sofri violência dos meus pais , ainda é porque a meta dele é pensar assim.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Que tipo de meta é essa?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "A meta imediata seria provavelmente a de “não sair na rua”. Ele está criando a ansiedade e o medo para ficar em casa.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Mas por que ele não quer sair na rua? Essa é a questão.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Bem, pense na situação do ponto de vista dos pais. Como você se sentiria se seu filho ficasse trancado no quarto?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Eu me preocuparia, é claro. Iria querer ajudá-lo a voltar à sociedade. Iria querer que melhorasse e me perguntaria se o criei de forma errada. Faria de tudo para ajudá-lo a voltar à vida normal.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "É aí que está o problema.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Onde?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Se eu fico no quarto o tempo todo, meus pais vão se preocupar. Com isso, consigo atrair a atenção deles. Os dois vão ficar extremamente cautelosos comigo e sempre me tratarão com todo o cuidado. Por outro lado, se eu ponho o pé fora de casa, passo a fazer parte da multidão anônima à qual ninguém presta atenção. Estarei cercado de gente que não conheço e acabarei sendo uma pessoa comum. E ninguém mais terá cuidados especiais comigo… Histórias de indivíduos reclusos são bastante comuns.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Nesse caso, seguindo sua linha de raciocínio, meu amigo atingiu sua meta e está satisfeito com a situação atual?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Duvido que esteja satisfeito e tenho certeza de que não está feliz. Mas não resta dúvida de que está agindo de acordo com sua meta. Não é só seu amigo que faz isso. Cada um de nós está vivendo de acordo com alguma meta. É o que diz a teleologia.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Escute: esta discussão não vai levar a lugar nenhum se ficarmos conversando apenas sobre seu amigo. Vai virar um julgamento à revelia, e isso seria inútil. Vamos pegar outro exemplo.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Que tal uma história sobre algo que me aconteceu ontem?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Ah! Nesse caso, sou todo ouvidos.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Ontem à tarde, eu estava lendo um livro numa cafeteria e um garçom passou por mim e derramou café na minha jaqueta. Eu tinha acabado de comprá-la. Não consegui evitar: perdi a cabeça e berrei com ele. Não sou o tipo de pessoa que fala alto em locais públicos, mas naquele momento todos ali ouviram meus gritos, porque tive um acesso de raiva e não sabia o que estava fazendo. O que acha? Em algum lugar desta situação existe uma meta envolvida? Qualquer que seja seu ponto de vista, meu comportamento não foi gerado por uma causa?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Você foi levado pela emoção e acabou perdendo a cabeça. Embora costume ser gentil, não resistiu e sentiu raiva. Você não conseguiu se controlar. É isto que está dizendo?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "É, aconteceu de uma hora para outra. As palavras simplesmente jorraram da minha boca antes que eu tivesse tempo de pensar.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Então suponha que você tivesse levado uma faca e, ao explodir, perdesse o controle e esfaqueasse o garçom. Você continuaria podendo justificar seu ato dizendo “Não consegui me controlar”?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Espere aí, este é um argumento extremo!",
"type": "exclamation"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Não é um argumento extremo. Se levarmos seu raciocínio adiante, qualquer delito cometido com raiva pode ser atribuído à raiva e deixará de ser responsabilidade da pessoa porque, essencialmente, você está dizendo que as pessoas não conseguem controlar suas emoções.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Como você explica minha raiva, então?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "É fácil. Você não teve um acesso de raiva e depois começou a berrar. Simplesmente ficou zangado para poder berrar. Em outras palavras, para alcançar a meta de gritar, você criou a emoção da raiva.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "A meta de berrar nasceu antes de qualquer outra coisa. Quer dizer, ao gritar, você queria que o garçom se submetesse a você e ouvisse o que tinha a dizer. Para isso, criou a raiva.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Eu criei? Você está de brincadeira!",
"type": "exclamation"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Então por que elevou a voz?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Eu já disse: perdi o controle. Fiquei muito chateado.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Não. Você poderia ter esclarecido as coisas sem elevar a voz, e o garçom provavelmente pediria desculpas sinceras, limparia sua jaqueta com um pano limpo e tomaria as providências necessárias. Em algum ponto da sua mente, você estava prevendo que ele poderia fazer isso, mas, mesmo assim, berrou. O procedimento de explicar os fatos de maneira racional pareceu muito trabalhoso, então você tentou se livrar dele e fazer aquela pessoa que não opôs nenhuma resistência se submeter a você. A ferramenta que usou para isso foi a raiva.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Negativo. Você não me engana. Então eu criei a raiva para ele se submeter a mim? Eu juro que nem por um segundo sequer parei para pensar numa coisa dessas. Eu não refleti e depois fiquei irritado. A raiva é uma emoção impulsiva.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Tem razão, a raiva é uma emoção instantânea. Mas agora escute a história que eu vou lhe contar. Certo dia, mãe e filha estavam discutindo aos berros. De repente, o telefone tocou. A mãe pegou o fone às pressas e, com a voz ainda carregada de raiva, disparou: “Alô?” Do outro lado da linha estava o professor do colégio da filha. Assim que a mãe percebeu, mudou a maneira de falar e ficou bem-educada. Nos cinco minutos seguintes, conduziu a conversa com o melhor tom de voz possível. Quando desligou, sua expressão mudou imediatamente e ela voltou a gritar com a filha.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Bem, não é uma história tão incomum.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Percebeu? Em suma, a raiva é uma ferramenta que pode ser empregada na medida do necessário. Pode ser posta de lado no momento em que o telefone toca e reutilizada depois que a pessoa desliga. A mãe não está berrando com uma raiva incontrolável, apenas usando a raiva para dominar a filha, falando mais alto, e, assim, impor suas opiniões.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então a raiva é um meio de alcançar uma meta?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "É o que diz a teleologia.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Em que sentido estou sendo niilista?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Pense bem. Você está simplesmente negando a emoção humana, dizendo que as emoções nada mais são que ferramentas, simples meios para alcançar metas. Mas, se você nega a emoção, está sustentando uma visão que tenta negar nossa humanidade também. Porque nossa emoção e o fato de sermos dominados por todos os tipos de sentimentos são o que nos torna humanos. Se negamos as emoções, nos reduziremos a simples máquinas em versões inferiores. Se isso não é niilismo, o que é?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Eu não estou negando que a emoção exista. Todos nós temos emoções. Ninguém pode negar. Mas, se você me diz que as pessoas são incapazes de resistir ao apelo delas, eu contesto. A psicologia adleriana é uma filosofia diametralmente oposta ao niilismo. Nesse sentido, embora ela mostre que “as pessoas não são controladas pelas emoções”, também mostra que “não somos controlados pelo passado”.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Quer dizer que as pessoas não são controladas nem pela emoção nem pelo passado?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Vamos inventar um personagem cujos pais se divorciaram no passado. Isso é algo tão objetivo quanto a água do poço que está sempre a 18 graus, certo? Mas esse divórcio parece frio ou quente? Ora, isso é uma questão subjetiva, do “agora”, que independe do que possa ter acontecido no passado. É o sentido atribuído ao fato que determina como será o presente de alguém.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então a questão não é “o que aconteceu”, mas “como foi resolvido”.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Exato. Não podemos retornar ao passado em uma máquina do tempo. Não podemos voltar os ponteiros do relógio. Se você se fixar na etiologia, permanecerá preso no passado e nunca conseguirá encontrar a felicidade.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Concordo que não podemos mudar o passado, e exatamente por isso a vida é tão difícil.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "A vida não é apenas difícil. Se o passado determinasse tudo, não seríamos capazes de dar passos significativos. Qual seria o resultado? Um tipo de niilismo e pessimismo que mata qualquer esperança no mundo e faz desistir da vida. A etiologia freudiana, tipificada pelo argumento do trauma, é uma forma diferente de determinismo e é o caminho para o niilismo. Você vai aceitar valores como esses?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Pense nas possibilidades. Se você supõe que as pessoas são capazes de mudar, um conjunto de valores baseados na etiologia se torna insustentável, e você é compelido a assumir a teleologia como algo normal.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então devemos sempre partir da premissa de que as pessoas são capazes de mudar?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Tudo bem. Deixe eu lhe contar uma história de outro amigo meu, que vou chamar de Y. Ele tem uma personalidade marcante e conversa facilmente com qualquer um. Todos o adoram, e as pessoas sorriem quando ele está por perto. Já eu sou meio esquisito e sempre tive dificuldade nas interações sociais. Você afirma que, pela teleologia de Adler, as pessoas podem mudar, certo?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sim. Qualquer um pode mudar.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então acha que posso me tornar alguém como Y? Do fundo do coração, eu gostaria de poder ser como ele.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Devo dizer que isso está fora de questão.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Arrá! Agora você está mostrando sua verdadeira posição! Vai desmentir sua teoria?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Não, não vou. Infelizmente, você ainda tem pouquíssima compreensão da psicologia adleriana. O primeiro passo para a mudança é o conhecimento.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então, se eu conseguir entender um pouquinho que seja a respeito do pensamento de Adler, vou poder me tornar uma pessoa como Y?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Por que essa pressa para obter as respostas? Você deveria chegar a elas por si mesmo, e não depender do que pode obter de outra pessoa. As respostas dos outros não passam de quebra-galhos, não têm qualquer valor. Veja Sócrates, que não deixou nenhum livro escrito. Ele passou a vida em debates públicos com os cidadãos de Atenas – especialmente os jovens –, e foi seu discípulo Platão quem organizou sua filosofia em textos para as gerações futuras. Adler também mostrou pouco interesse pelas atividades literárias, preferindo manter diálogos pessoais nos cafés de Viena e pequenos grupos de discussão. Sem dúvida, não foi um intelectual de gabinete.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então tanto Sócrates como Adler transmitiram suas ideias por meio de diálogos?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Isso mesmo. Todas as suas dúvidas serão dissipadas durante a nossa conversa e você começará a mudar. Não por causa das minhas palavras, mas por vontade própria. Não quero privá-lo do valioso processo de chegar às respostas pelo diálogo.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Você está querendo dizer que vamos tentar reproduzir o tipo de diálogo utilizado por Sócrates e Adler?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Não está bom para você?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Isso é o que espero descobrir! Vamos avançar o máximo possível, até você desistir da sua teoria ou eu dar o braço a torcer. VOCÊ ESTÁ BEM DO JEITO QUE ESTÁ?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Ok, voltando à sua pergunta: você gostaria de ser mais animado, como Y, certo?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Mas você acabou de rejeitar essa possibilidade, disse que estava fora de cogitação. Bem, acho que é assim que as coisas são. Na verdade, eu só disse isso para desafiar você… Eu me conheço bem. Jamais conseguiria ser como ele.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Por quê?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "É óbvio. Porque temos personalidades diferentes, ou, como acho que você diria, “disposições diferentes”.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Você, por exemplo, vive cercado por todos esses livros. Lê um livro novo e adquire conhecimentos novos. Basicamente, vive acumulando conhecimentos. Quanto mais lê, mais sabe. Você acha que novos conceitos são valiosos e tem a impressão de que eles mudam você. Olhe, sinto muito lhe dizer isto, mas, por mais conhecimentos que adquira, seu temperamento e sua personalidade permanecerão os mesmos. Se sua base for distorcida, tudo o que você aprendeu será inútil. Todos os conhecimentos que adquiriu desmoronarão à sua volta, e você descobrirá que voltou à estaca zero. O mesmo vale para as ideias de Adler. Por mais que eu aprenda sobre elas, minha personalidade continuará igual. Conhecimentos apenas se acumulam como conhecimentos, até serem descartados ou esquecidos, mais cedo ou mais tarde.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Então, deixe-me fazer uma pergunta: por que você acha que quer ser como Y? Suponho que você só queira ser diferente, seja Y ou outra pessoa. Mas qual é o objetivo?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Você está falando sobre metas de novo? Como eu já disse, admiro meu amigo e acho que seria mais feliz se fosse como ele.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Você acha que seria mais feliz se fosse como ele. O que significa que não está feliz agora, certo?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Quê?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Neste exato momento, você é incapaz de se sentir feliz de verdade. Isso porque não aprendeu a amar a si mesmo. E, para tentar amar a si mesmo, deseja renascer como uma pessoa diferente. Você espera ser como Y e descartar quem você é agora. Certo?",
"type": "question"
},
{
"from": "User",
"text": "Sim, acho que você está certo. Vamos encarar os fatos: eu me odeio! Eu sou alguém que está perdendo tempo com esse discurso filosófico ultrapassado e não consegue deixar de fazer esse tipo de coisa… Sim, eu realmente me odeio.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "E você? Gosta de si mesmo?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "No mínimo, acho que não gostaria de ser uma pessoa diferente e aceito ser quem sou.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Você aceita ser quem é?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Veja bem, por mais que você queira ser Y, não conseguirá renascer como ele. Você não é Y. E não existe mal algum em você ser você. Não estou dizendo que está certo você ser “exatamente do jeito que é”. Se você não consegue se sentir feliz, é claro que as coisas não estão bem do jeito atual. Você precisa dar um passo à frente, depois outro e não parar mais.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "É uma forma cruel de dizer isso, mas entendi. É claro que não estou bem do jeito que sou. Preciso progredir.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "De jeito nenhum. Isso é um absurdo.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Porque algumas pessoas nascem em berço de ouro, têm bons pais, e outras nascem pobres e têm pais ruins. O mundo é assim. Não estou com a menor vontade de tocar neste tipo de assunto, mas não existe igualdade no mundo, e as diferenças entre cor de pele, sexo e nacionalidade têm mais importância do que nunca. É natural se concentrar naquilo com que você nasceu, e toda essa sua conversa é apenas teoria acadêmica. Você está ignorando o mundo real!",
"type": "exclamation"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "É você quem está ignorando a realidade. Por acaso consegue mudar a realidade quando se fixa naquilo com que nasceu? Não somos máquinas substituíveis. Não precisamos de substituição, mas de renovação.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Para mim, substituição e renovação são a mesma coisa. Você está evitando o ponto principal. Existe uma infelicidade que vem de nascença. Antes de tudo, você precisa reconhecer isso.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Não vou reconhecer isso.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Por quê?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Em primeiro lugar, neste momento você é incapaz de se sentir verdadeiramente feliz. Você acha a vida difícil e até gostaria de poder renascer como uma pessoa diferente. Mas está infeliz agora porque optou por “ser infeliz”, não por ter nascido com azar.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Eu optei por ser infeliz? Como posso aceitar isso?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Não há nada de extraordinário nesse conceito. Ele vem sendo repetido desde a Antiguidade clássica. Você já ouviu a frase “Ninguém faz o mal voluntariamente”? Essa é uma afirmação conhecida como paradoxo socrático.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Mas não faltam pessoas que fazem o mal de propósito, não é? Existe um monte de ladrões e assassinos, isso sem contar todos os políticos e as autoridades com suas negociatas. Talvez seja mais difícil encontrar uma pessoa realmente boa que não deseje o mal.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sem dúvida, não faltam comportamentos maus. Mas ninguém, nem mesmo o pior bandido, se envolve no crime apenas pelo desejo de se envolver em atos cruéis. Todo malfeitor tem uma justificativa interna para se envolver no crime. Uma briga por dinheiro leva alguém a cometer um assassinato, por exemplo. Para o criminoso, existe uma justificativa que pode ser enunciada como a realização do “bem”. Claro que, nesse caso, não se trata do bem no sentido moral, mas do bem no sentido de ser “benéfico para a própria pessoa”.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "“Benéfico para a própria pessoa”?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "A palavra grega que designa “bem” ( agathon ) não tem significado moral. Significa apenas “benéfico”. A palavra que designa “mal” ( kakon ) significa “não benéfico”. Nosso mundo está cheio de todo tipo de injustiças e maldades, mas não existe ninguém que deseje o mal no sentido mais puro da palavra, que é “não benéfico” para ninguém.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "O que isso tem a ver comigo?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Em algum estágio da sua vida, você optou por “ser infeliz”. Não foi porque nasceu em circunstâncias infelizes ou foi parar numa situação infeliz. Isso aconteceu porque você achou “ser infeliz” uma coisa boa.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Por quê? Para quê?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Por que optou por ser infeliz? Não tenho como saber a resposta. Talvez isso fique mais claro à medida que debatermos.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sente-se. É natural que haja divergências entre os nossos pontos de vista. Agora deixe-me dar uma explicação simples sobre como a psicologia adleriana entende o ser humano.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Tudo bem, mas seja breve, por favor.",
"type": "statement"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Você disse que é impossível mudar o temperamento ou a personalidade de qualquer pessoa. Na psicologia adleriana, usamos a expressão “estilo de vida” para descrever a personalidade e o temperamento.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Estilo de vida?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sim. Estilo de vida são nossas tendências de pensamento e ação.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Pode ser mais específico?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Claro. O estilo de vida reflete como a pessoa enxerga o mundo. E como enxerga a si própria. Pense no estilo de vida como um conceito que reúne formas de encontrar sentido. Estritamente falando, o estilo de vida poderia ser definido como a personalidade de alguém. De um modo mais amplo, é uma expressão que abrange a visão de mundo e a perspectiva de vida de alguém.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Mas o que isso significa?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Digamos que alguém esteja preocupado consigo mesmo e diga: “Sou um pessimista.” Essa mesma pessoa poderia reformular a frase e dizer: “Tenho uma visão de mundo pessimista.” Você pode considerar que a questão aí não é a personalidade, mas a visão de mundo. Parece que a palavra “personalidade” sugere algo imutável. Por outro lado, é possível alterar uma visão de mundo.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Isso é meio confuso. Quando você fala de estilo de vida, se refere a um “modo de viver”?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sim, você pode se referir a isso dessa maneira. Para ser mais preciso, é “a forma como nossa vida deveria ser”. Provavelmente, você acredita que o temperamento ou a personalidade seja algo inato, que nasceu com você, sem qualquer ligação com sua vontade, mas na psicologia adleriana considera-se estilo de vida tudo aquilo que você escolhe para si.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Então eu escolho meu estilo de vida?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Exatamente.",
"type": "statement"
},
{
"from": "User",
"text": "Certo. Quer dizer que, além de ter optado por ser infeliz, escolhi minha personalidade esquisita?",
"type": "question"
},
{
"from": "Polaris",
"text": "Sim.",
"type": "statement"